Acordo entre a República da Indonésia e a República Portuguesa
quanto à questão de Timor Leste

Os Governos da Indonésia e de Portugal,

Recordando as resoluções da Assembleia Geral 1514 (XV), 1541 (XV), 2625 (XXV) e as resoluções e decisões relevantes aprovadas pelo Conselho de Segurança e pela Assembleia Geral quanto à questão de Timor Leste;

Tendo em conta os esforços continuados dos Governos da Indonésia e de Portugal, desde Julho de 1983, através dos bons ofícios do Secretário-Geral, para encontrar uma solução justa, global e internacionalmente aceitável para a questão de Timor Leste;

Recordando o acordo de 5 de Agosto de 1988 para levar a cabo, sob os auspícios do Secretário-Geral, negociações sobre um estatuto especial baseado numa ampla autonomia para Timor Leste sem prejuízo das posições de princípio dos respectivos Governos quanto ao estatuto final de Timor Leste;

Tendo discutido um enquadramento constitucional para uma autonomia de Timor Leste com base num projecto apresentado pelas Nações Unidas, com as alterações introduzidas pelo Governo Indonésio;

Tomando a devida nota da posição do Governo da Indonésia de que a autonomia especial proposta deveria ser posta em prática apenas como uma solução final da questão de Timor Leste com total reconhecimento da soberania indonésia sobre Timor Leste;

Tomando a devida nota da posição do Governo de Portugal de que um regime de autonomia deveria ser transitório, não exigindo o reconhecimento da soberania indonésia sobre Timor Leste nem a retirada de Timor Leste da lista de Territórios Não Autónomos da Assembleia Geral, enquanto não existir uma decisão final quanto ao estatuto de Timor Leste por parte do povo timorense através de um acto de autodeterminação sob os auspicios das Nações Unidas;

Tendo em conta que apesar dos Governos da Indonésia e de Portugal manterem as suas posições de princípio quanto à proposta de autonomia especial elaborada, ambos concordam que é essencial fazer avançar o processo e que, portanto, os Governos da Indonésia e de Portugal concordam que o Secretário-Geral consulte o povo de Timor Leste sobre o enquadramento constitucional para autonomia que se encontra anexo a este documento;

Tendo em conta que os Governos da Indonésia e de Portugal pediram ao Secretário-Geral que concebesse o método e os procedimentos para a consulta popular mediante votação directa, secreta e universal;


Acordam o seguinte:

Artigo 1º
Solicitar ao Secretário-Geral para pôr a proposta de enquadramento constitucional em anexo, que concede uma autonomia especial a Timor Leste dentro da República unitária da Indonésia, à consideração do povo de Timor Leste, tanto dentro como fora do território, para que possa aceitá-lo ou rejeitá-lo por meio de uma consulta popular com base numa votação directa, secreta e universal.

Artigo 2º
Solicitar ao Secretário-Geral que, imediatamente após a assinatura deste Acordo, estabeleça uma missão das Nações Unidas para Timor Leste, de forma a permitir-lhe levar a cabo eficazmente a consulta popular.

Artigo 3º
O Governo da Indonésia será responsável pela manutenção da paz e segurança em Timor Leste de forma a garantir que a consulta popular se realize de uma forma justa e pacífica numa atmosfera livre de intimidação, violência e interferência de qualquer lado.

Artigo 4º
Solicitar ao Secretário-Geral que comunique o resultado da consulta popular ao Conselho de Segurança e à Assembleia Geral, bem como que informe os Governos da Indonésia e de Portugal e o povo de Timor Leste.

Artigo 5º
Se o Secretário-Geral apurar, com base no resultado da consulta popular e em conformidade com o presente acordo, que o enquadramento constitucional para uma autonomia especial proposto é aceite pelo povo de Timor Leste, o Governo da Indonésia tomará as medidas constitucionais necessárias para a entrada em vigor do enquadramento constitucional, e o Governo de Portugal dará início, no âmbito das Nações Unidas, aos procedimentos necessários para a retirada de Timor Leste da lista de Territórios Não Autónomos da Assembleia Geral e para a eliminação da questão de Timor Leste das ordens de trabalho do Conselho de Segurança e da Assembleia Geral.

Artigo 6º
Se o Secretário-Geral apurar, com base no resultado da consulta popular e em conformidade com o presente acordo, que o enquadramento constitucional para uma autonomia especial proposto não é aceite pelo povo de Timor Leste, o Governo da Indonésia dará todos os passos necessários, em termos constitucionais, para pôr termo ao seu vínculo com Timor Leste, restaurando desse modo, nos termos da lei indonésia, o estatuto detido por Timor Leste antes de 17 de Julho de 1976, e os Governos da Indonésia e de Portugal e o Secretário-Geral acordarão os moldes de uma transferência pacífica e ordeira da autoridade em Timor Leste para as Nações Unidas.
O Secretário-Geral dará início, nos termos de mandato legislativo apropriado desde que disponha de mandato legislativo para esse fim, ao procedimento que irá permitir a Timor Leste iniciar um processo de transição para a independência.

Artigo 7º
Durante o período de transição entre a conclusão da consulta popular e o início da execução de qualquer das opções, as partes requerem ao Secretário-Geral que mantenha uma presença adequada das Nações Unidas em Timor Leste.

Feito em Nova Iorque, neste dia 5 de Maio de 1999

Pelo Governo da Indonésia
Ali Alatas
Ministro dos Negócios Estrangeiros

Pelo Governo de Portugal
Jaime Gama
Ministro dos Negócios Estrangeiros


Testemunhado:
Kofi A. Annan
Secretário-Geral
Nações Unidas

 

Um enquadramento constitucional para uma autonomia especial para Timor Leste

 

 

PARTE UM
ESFERAS DE COMPETÊNCIA RESPECTIVAS


Capítulo I

O Governo (Central) Indonésio
Secção A: Relações Externas

Artigo 1º
O Governo Indonésio, doravante referido como Governo Central, terá a responsabilidade e a competência no âmbito dos negócios estrangeiros da Região Autónoma Especial de Timor Leste (RAETL).
O Governo Central consultará o Governo da RAETL com o objectivo de tomar em consideração os pontos de vista do Governo da RAETL em questões de particular relevância para a RAETL.

Secção B: Defesa

Artigo 2º

O Governo Central terá a responsabilidade e a competência no âmbito da defesa externa da RAETL, como parte do território do Estado unitário da República da Indonésia.

Artigo 3º
Para tal fim, as forças armadas indonésias (Tentara Nasional Indonesia - TNI) manterão uma presença militar na RAETL no contexto da defesa e da salvaguarda da segurança externa da RAETL.

Artigo 4º
No caso de um ataque armado externo, ou de ameaça iminente de um tal ataque, as forças armadas indonésias (TNI) poderão ser colocadas fora das suas bases ou zonas normais de operação no exercício do seu dever de defender a soberania e integridade territorial do Estado unitário da República da Indonésia.

Secção C: Políticas Económicas e Fiscais

Artigo 5º

A RAETL fará parte da unidade monetária e alfandegária indonésia e ficará sujeita às políticas, leis e regulamentos monetários e fiscais nacionais da Indonésia que sejam compatíveis com o presente Acordo.

Artigo 6º
O Governo Central continuará a proporcionar a sua ajuda ao desenvolvimento da RAETL.

Artigo 7º
O Governo Central terá competência exclusiva em termos de tributação nacional e o Governo da RAETL terá competência exclusiva em termos de tributação local, em conformidade com as leis e regulamentos existentes.

Artigo 8º
Os recursos naturais da RAETL, excepto os que forem considerados estratégicos ou vitais nos termos das leis nacionais, estarão sob o controlo do Governo da RAETL. Na exploração dos recursos naturais, o Governo Central e o Governo da RAETL poderão desenvolver iniciativas conjuntas ou em cooperação.

Artigo 9º
Tendo em vista o seu desenvolvimento global, o Governo da RAETL pode receber ajuda externa que será canalizada através do Governo Central.

Artigo10º
O Governo da RAETL pode celebrar empréstimos internos para financiar parte do seu orçamento, com o consentimento da Assembleia Regional de Representantes do Povo da RAETL.

Secção D: Aplicabilidade das Leis Indonésias
Artigo 11º
As leis indonésias que estiverem em vigor à data da entrada em vigor do presente Acordo e que se insiram na esfera de competência do Governo Central, tal como é definida neste capítulo, continuarão em vigor na RAETL.


Capítulo II

O Governo da Região Autónoma Especial de Timor Leste
Artigo 12º

Todas as questões, excepto as enumeradas no âmbito do Capítulo I da Parte Um, e conforme determinado nas cláusulas relevantes do presente Acordo, serão da responsabilidade e competência do Governo da RAETL.

Artigo13º
Os poderes do Governo da RAETL serão exercidos em conformidade com as disposições do presente Acordo e também em conformidade com a Constituição da República da Indonésia.

Artigo14º
O Governo da RAETL não poderá

a) restringir os direitos dos trabalhadores reconhecidos na lei; e

b) reservar o exercício de qualquer profissão ou cargo público apenas a pessoas com identidade timorense.

Capítulo III

Jurisdição do Governo Central e do Governo da RATL

Artigo 15º

O Governo da RAETL terá jurisdição sobre os crimes cometidos na RAETL, com excepção dos relacionados com traição e terrorismo, droga e outros crimes internacionais, sobre os quais prevalecem as leis e a jurisdição indonésias.

PARTE DOIS IDENTIDADE TIMORENSE E IMIGRAÇÃO


Capítulo I

Definição

Artigo 16º

Qualquer pessoa,

a) que fosse residente legal em Timor Leste antes de ou em Dezembro de 1975,

b) cujo pai, mãe, avô ou avó fosse residente legal em Timor Leste antes de ou em Dezembro de 1975, ou

c) que tenha residido permanentemente em Timor Leste por um período de pelo menos cinco anos à data de entrada em vigor do presente Acordo,
será considerada como tendo identidade timorense, independentemente da nacionalidade que detenha, e terá direito a domicílio permanente em Timor Leste.

Capítulo II

Aquisição da Identidade e Imigração

Artigo17º
O Governo da RAETL terá o direito exclusivo de determinar as normas e procedimentos segundo os quais pessoas que não têm identidade de Timor Leste poderão adquirir essa identidade.

Artigo18º
O Governo Central terá o poder de exercer controlos de imigração à entrada e saída da RAETL de indivíduos que não sejam cidadãos da Indonésia, nem tenham identidade timorense em conformidade com a sua autoridade nos termos do Artigo 1º do presente Acordo.

Artigo19º
A RAETL terá a autoridade para emitir documentos a indivíduos de modo a identificar aqueles que têm identidade timorense.

Capítulo III

Símbolos de Identidade

Artigo 20º

A RAETL poderá adoptar um escudo próprio. A bandeira nacional da Indonésia será hasteada e o hino nacional da Indonésia "Indonesia Raya" será executado em todos os locais e ocasiões em que tal seja exigido pelas leis e práticas existentes.

Artigo 21º
A RAETL pode participar em nome próprio, com a concordância do Governo Central, em acontecimentos culturais e desportivos internacionais em que participem outras entidades não estatais.

PARTE TRÊS PODERES E INSTITUIÇÕES DA RAETL



Capítulo I

Poderes e Instituições Legislativos da RAETL

Artigo 22º
O poder legislativo da RAETL abrangerá todas as questões que não sejam da competência do Governo Central, conforme definida no Capítulo I da Parte Um.
Este poder abrangerá: a definição de políticas nas áreas política, económica e social; questões culturais e educativas; designação de uma segunda língua ou línguas para além da língua oficial, Bahasa Indonesia; a criação de tribunais de primeira instância nos termos do Artigo 40º; normas de direito de família e sucessões; a manutenção de ordem pública, incluindo a criação de uma força de polícia timorense que será responsável pela aplicação de todas as leis e regulamentos da RAETL, de acordo com as leis e regulamentos da República da Indonésia.

Artigo 23º
A RAETL pode aprovar legislação que regule ou restrinja a propriedade de bens imóveis por parte de pessoas que não tenham identidade de Timor Leste sem violar direitos adquiridos legitimamente.

Artigo 24º
A RAETL terá autoridade para criar uma Comissão de Registo Fundiário, cujos membros serão escolhidos de acordo com o modo prescrito para a selecção de juízes no Artigo 42º, que fará recomendações tendo em vista a resolução, através dos tribunais, de todos os conflitos de direitos de propriedade de bens imóveis.

Artigo 25º
A Assembleia Regional de Representantes do Povo da RAETL

1. O poder legislativo pertencerá e será exercido pela Assembleia Regional dos Representantes do Povo da RAETL, eleitos por pessoas de identidade de Timor Leste conforme definida na Parte Dois, com base no sufrágio universal de adultos.
A realização de eleições para a Assembleia Regional de Representantes da RAETL será determinada posteriormente pela RAETL e não precisa de coincidir com as eleições nacionais.

2. Os membros da Assembleia Regional de Representantes do Povo da RAETL serão pessoas que preencham as condições de elegibilidade para o cargo.
Não serão impostas condições raciais, étnicas, religiosas, de nacionalidade nem quaisquer outras não relacionadas com o exercício das funções de membro da Assembleia.

3. Os membros da Assembleia Regional de Representantes do Povo da RAETL terão imunidade em relação a acções legais relacionadas com as suas declarações orais ou escritas ou actos relacionados com as actividades da Assembleia, ou realizados ou assumidos na sua qualidade de membros da Assembleia.

Capítulo II

Poderes e Instituições Executivos do Governo da RAETL

Artigo 26º

O poder executivo do Governo da RAETL será exercido por um Governador que será auxiliado por uma Conselho Consultivo cujos membros serão nomeados pelo Governador por recomendação da Assembleia Regional de Representantes do Povo da RAETL.

Artigo 27º
O Governo da RAETL terá competência para delinear, conduzir e executar políticas e programas e emitir decretos e regulamentos de execução no âmbito das leis da RAETL. Será também responsável por garantir que todas as leis e regulamentos aplicáveis na RAETL sejam fielmente administrados e executados.

Artigo 28º
O Governador da RAETL será eleito por uma maioria dos membros da Assembleia Regional de Representantes do Povo da RAETL e será perante ela responsável. A lista de candidatos ao cargo de Governador da RAETL será previamente submetida ao Presidente da República da Indonésia e por ele aprovada.

Artigo 29º
O Governador eleito será formalmente confirmado no cargo pelo Presidente da República da Indonésia e será formalmente investido perante a Assembleia Regional de Representantes do Povo da RAETL.

Artigo 30º
O Governador designará funcionários que serão responsáveis pelos serviços executivos e outros órgãos da RAETL.

Artigo 31º
O Governo da RAETL terá a responsabilidade pela manutenção da ordem pública na RAETL e pela administração e execução de todas as leis e regulamentos no âmbito da RAETL.

Artigo 32º
Haverá uma Força de Polícia da RAETL que será organizada de harmonia com as leis regionais.

Artigo 33º
A Força de Polícia da RAETL estará sujeita à autoridade e controlo do Governo da RAETL.

Artigo 34º
Os membros da Força de Polícia da RAETL serão recrutados sem discriminação com base motivos raciais, étnicos ou religiosos.

Artigo 35º
As principais funções da Força de Polícia da RAETL serão:

a) preservar a paz interna e a ordem em Timor Leste; e

b) manter e, quando necessário, executar a lei de forma imparcial e objectiva.

Capítulo III

Poderes e Instituições Judiciais da RAETL Artigo 36º
O poder judicial da RAETL pertencerá e será exercido por tribunais independentes.

Artigo 37º
Os tribunais da RAETL terão competência sobre todas as questões civis, criminais, administrativas e outras que se insiram na esfera de competência da RAETL.

Artigo 38º
Em qualquer acção civil, com o consentimento de todas as partes dessa acção, os tribunais podem aplicar qualquer direito costumeiro aplicável entre essas partes e reconhecido como tal pelos tribunais da RAETL.

Artigo 39º
O poder judicial da RAETL será constituído por tantos Tribunais de Primeira Instância quantos forem criados por regulamentos da RAETL, um Tribunal de Recurso, um Tribunal de Recurso Final e o Ministério Público.

Artigo 40º
Tribunais de Primeira Instância

1. Haverá Tribunais de Primeira Instância na RAETL para administração da justiça. Tais tribunais terão a competência originária civil, criminal e administrativa que seja necessária para administrar as leis em vigor na RAETL.

2. Os Tribunais de Primeira Instância serão constituídos por tantos juízes quantos os exigidos pela adequada administração da justiça.

Artigo 41º
O Tribunal de Recurso

1. Haverá um Tribunal de Recurso, formado por um Presidente e tantos juízes quantos forem necessários, que terá competência de recurso das decisões dos Tribunais de Primeira Instância.

2. O Tribunal de Recurso terá também competência originária e de recurso sobre todos os casos que se refiram à interpretação das leis indonésias aplicáveis na RAETL ou à interpretação das Partes Um, Cinco e Seis do presente Acordo.

3. O Presidente do Tribunal de Recurso será nomeado pelo Presidente do Supremo Tribunal da República da Indonésia, por recomendação de uma Comissão Judicial Independente, que será criada de acordo com os procedimentos aprovados pela Assembleia Regional de Representantes do Povo da RAETL.

Artigo 42º
Os juízes dos Tribunais de Primeira Instância e do Tribunal de Recurso serão escolhidos pela Comissão Judicial.

Artigo 43º
A Comissão Judicial terá também competência para decidir questões disciplinares e outras relacionadas com o desempenho dos juizes, nos termos definidos pela Assembleia Regional de representantes do Povo da RAETL.

Artigo 44º
Tribunal de Recurso Final

1. O Tribunal de Recurso Final da RAETL será o Supremo Tribunal da Indonésia.

2. Das decisões do Tribunal de Recurso caberá recurso para o Supremo Tribunal da Indonésia, o qual poderá ser invocado por qualquer das partes em litígio:

a) em todos os casos relacionados com a aplicação das leis e regulamentos da Indonésia aplicáveis na RAETL;

b) em todos os casos relacionados com a interpretação do presente Acordo, desde que o Supremo Tribunal crie uma secção especial para a apreciação desses casos, formada por um número ímpar de juízes pertencentes ao Supremo Tribunal da Indonésia e juízes ad hoc pertencentes ao Tribunal de Recurso de Timor Leste da RAETL.

3. Das decisões do Tribunal de Recurso caberá recurso para o Supremo Tribunal da Indonésia, com a aceitação do Tribunal de Recurso:

a) em todos os casos relacionados com a interpretação das leis e regulamentos regionais da RAETL;

b) em questões de direito suscitadas em processos civis e penais.

Artigo 45º
A nomeação, exoneração e competências do Ministério Público serão definidas pelas leis e regulamentos regionais da RAETL.

PARTE QUATRO PROMOÇÃO E PROTECÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS E LIBERDADES FUNDAMENTAIS

Artigo 46º
O Governo Central e o Governo da RAETL promoverão, protegerão e respeitarão os direitos humanos e as liberdades fundamentais sem discriminações de qualquer tipo, tal como estão consignados, entre outros, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Declaração de Viena sobre os Direitos Humanos, de 1993, e o Decreto da Assembleia Consultiva do Povo n.º XVII/MPR/1998 Relativo aos Direitos Humanos. Estes direitos e liberdades fundamentais incluem:

a) liberdade de pensamento, consciência e religião;

b) o direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal;

c) não ser submetido a tortura, violência, prisão arbitrária, detenção, ou exílio;

d) o direito a uma audiência completa e justa por parte de um tribunal independente e imparcial, a fim de determinar quaisquer direitos ou obrigações civis ou qualquer acusação criminal;

e) liberdade de expressão em todas as suas formas, de associação e de reunião pacífica;

f) o direito a formar partidos políticos específicos de Timor Leste sem restrições de qualquer tipo e de acordo com o preceituado no Artigo 57º;

g) o direito de participar no governo sem discriminação, através de eleições livres e periódicas e acesso não discriminatório à função pública, de acordo com o preceituado no Artigo 25º:

h) o direito a participar na vida política nacional indonésia, incluindo o direito a votar em eleições gerais e a ser eleito membro do Parlamento nacional indonésio ou a ser nomeado membro da Assembleia Consultiva do Povo;

i) o direito a integrar os serviços públicos e administrativos indonésios sem discriminação por quaisquer motivos;

j) liberdade de movimento em todo o território da República da Indonésia;

k) o direito de todos a gozarem e participarem na sua cultura;

l) o direito à propriedade e a não ser privado arbitrariamente dela;

m) o direito à protecção da vida familiar, privacidade, lar e correspondência;

n) o direito à educação, incluindo, como um mínimo, o direito à educação primária gratuita para todos;

o) o direito a um nível de vida adequado, de acordo com os recursos e capacidades disponíveis;

p) o direito das mulheres a uma participação plena e igualitaria na vida política, civil, económica, social e cultural;

q) os direitos da criança, sem discriminação de qualquer tipo, tal como consignados na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança.

PARTE CINCO RELAÇÃO ENTRE O GOVERNO CENTRAL E O GOVERNO DA RAETL


Artigo 47º
O Governo Central tomará em consideração os pontos de vista do Governo da RAETL aquando da aprovação de leis, regulamentos e políticas que se insiram na esfera de competência do Governo Central e que possam ter um efeito directo na RAETL.

Artigo 48º
Na execução daquelas leis, regulamentos ou políticas do Governo Central aplicáveis na RAETL, conforme estabelecido do Capítulo I da Parte Um, o Governo da RAETL cooperará com os departamentos relevantes do Governo Central.

Artigo 49º
O Governo central nomeará um alto funcionário, que residirá em Díli, para exercer as competências do Governo Central na RAETL, e para coordenar e supervisionar todos os funcionários do Governo Central na RAETL que possam ser necessários para auxiliar o Governo da RAETL na execução de leis, regulamentos e políticas que se insiram na esfera de competência do Governo Central, conforme estabelecido do Capítulo I da Parte Um, e para desempenhar as funções previstas, adiante, no Artigo 50º.

Artigo 50º
O Governo Central e o Governo da RAETL podem criar órgãos ou outras instâncias para simplificar a consulta, cooperação e coordenação em questões como questões de polícia, turismo, transportes, telecomunicações, educação, saúde e ambiente.

Artigo 51º
No desempenho dos seus deveres, a Força de Polícia da RAETL consultará e cooperará com as autoridades do Governo Central no que respeita à execução das leis nacionais indonésias na RAETL.

Artigo 52º
A Força de Polícia da RAETL tomará as medidas necessárias, a pedido da Polícia Nacional Indonésia, para deter pessoas na RAETL que sejam acusadas de terem cometido crimes fora da RAETL.

Artigo 53º
A Polícia Nacional Indonésia tomará as medidas necessárias, em cooperação com a Força de Polícia da RAETL, para deter pessoas fora da RAETL acusadas de terem cometido crimes na RAETL.

Artigo 54º
Em casos excepcionais, a Polícia Nacional Indonésia ajudará a Força de Polícia da RAETL no desempenho das suas funções.

PARTE SEIS RELAÇÕES ENTRE A REGIÃO AUTÓNOMA ESPECIAL DE TIMOR LESTE E OUTRAS ENTIDADES


Artigo 55º
Sem prejuízo da responsabilidade e competência do Governo Central, conforme estabelecida no Artigo 1º,

a) o Governo da RAETL pode, com o consentimento do Governo Central, celebrar acordos e realizar actividades sociais, culturais, comerciais, ambientais, de transportes, científicas, técnicas, de turismo e desportivas com governos regionais / cidades de países estrangeiros e organizações internacionais;

b) o Governo da RAETL pode solicitar e obter ajuda internacional ao desenvolvimento, com o consentimento do Governo Central; e c) os governos estrangeiros podem abrir, com o consentimento do Governo Central, escritórios de representação não diplomática na RAETL.br>

PARTE SETE AS NAÇÕES UNIDAS


Artigo 56º
O Secretário-Geral das Nações Unidas terá a responsabilidade e a autoridade para fiscalizar e verificar o cumprimento do presente Acordo.
Esta autoridade inclui a fiscalização da eleição dos membros da Assembleia Regional de Representantes do Povo da RAETL e a verificação de que essas eleições são livres e justas.
Para esse fim, o Secretário-Geral das Nações Unidas pode criar na RAETL as representações que considere necessárias, que funcionarão durante um período específico, a determinar por acordo posterior entre as Nações Unidas e o Governo Indonésio.

PARTE OITO CLÁUSULA GERAL


Artigo 57º
A autonomia especial de Timor Leste, conforme estabelecida no presente Acordo, é concedida no quadro da Constituição da República da Indonésia.

PARTE NOVE LEI FUNDAMENTAL DA RAETL


Artigo 58º
A RAETL reger-se-á por uma lei fundamental, aprovada pela primeira Assembleia Regional de Representantes do Povo da RAETL eleita, que será conforme às disposições do presente Acordo.

PARTE DEZ DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS


Artigo 59º
As seguintes disposições manter-se-ão em vigor entre a entrada em vigor do presente Acordo e a eleição e tomada de posse da Assembleia Regional de Representantes do Povo da RAETL e do Governo da RAETL:

a) Haverá um Conselho de Transição amplamente representativa, composta por não mais de 25 pessoas de identidade timorense, cujos membros serão nomeados pelo Secretário-Geral das Nações Unidas após consulta aos indivíduos e grupos relevantes na RAETL e ao Governo da Indonésia. b) O Conselho de Transição pode aprovar leis e regulamentos regionais para a eleição da primeira Assembleia Regional de Representantes do Povo da RAETL e para os assuntos que possam ser acordados pelas partes do presente Acordo, em conformidade com as leis vigentes, a fim de assegurar o funcionamento regular da administração geral, serviços públicos e ordem pública.

c) O Secretário-Geral das Nações Unidas, o Governo da Indonésia e o Conselho de Transição iniciarão consultas para garantir a aplicação efectiva do presente Acordo e o processo de transição suave e pacífico na RAETL.

d) O Secretário-Geral das Nações Unidas, o Governo da Indonésia e o Conselho de Transição criarão um grupo de trabalho que se ocupará das disposições de segurança durante o período transitório


 

 

 

 

 

Consulta popular em Timor Leste

 

 

Os Governos da Indonésia e Portugal e o Secretário-Geral das Nações Unidas,

Acordam o seguinte:

1. Um ambiente seguro isento de violência e de outras formas de intimidação constitui um pré-requisito para a realização de uma votação livre e justa em Timor Leste.
A responsabilidade pela garantia de um tal ambiente bem como pela manutenção geral da lei e da ordem recai sobre as autoridades de segurança indonésias apropriadas.
A neutralidade absoluta das TNI (Forças Armadas Indonésias) e da Polícia Indonésia é essencial quanto a este aspecto.

2. A Comissão para a Paz e Estabilidade criada em Díli a 21 de Abril de 1999 deveria tornar-se operacional sem demora.
A Comissão, em cooperação com as Nações Unidas, elaborará um código de conduta, que obrigará todas as partes, durante o período pré e pós consulta, garantirá a deposição das armas e dará os passos necessários para realizar o desarmamento.

3. Antes do início do recenseamento, o Secretário-Geral certificar-se-á, com base na avaliação objectiva da missão das Nações Unidas, da existência da situação de segurança necessária para uma execução pacífica do processo de consulta.

4. A polícia será exclusivamente responsável pela manutenção da lei e da ordem.
O Secretário-Geral, após obtenção do necessário mandato, disponibilizará um contingente de polícia civil para funcionarem como assessores da Polícia Indonésia no cumprimento dos seus deveres e, no dia da consulta, para supervisionarem a escolta dos boletins de voto e das urnas de e para os locais de voto.

Feito em Nova Iorque neste dia 5 de Maio de 1999

Pelo Governo da Indonésia
Ali Alatas
Ministro dos Negócios Estrangeiros

Pelas Nações Unidas
Kofi A. Annan
Secretário-Geral

Pelo Governo de Portugal
Jaime Gama
Ministro dos Negócios Estrangeiros

 

 

 

 

Acordo relativo às modalidades da consulta popular ao povo de Timor Leste através de uma votação directa

 

 

Os Governos da Indonésia e Portugal e o Secretário-Geral das Nações Unidas,

Acordam o seguinte:

Imediatamente após a assinatura do acordo entre os dois Governos pedindo ao Secretário-Geral que consulte o povo de Timor Leste sobre se aceita ou rejeita o enquadramento constitucional para a autonomia proposto, o Secretário-Geral iniciará, nos termos de mandato legislativo apropriado, os preparativos para a consulta popular, colocando em Timor Leste todo o pessoal necessário para a execução das várias fases do processo de consulta.
Os preparativos para a votação fora de Timor Leste iniciar-se-ão também em locais de maior concentração de naturais de Timor Leste fora do território.

A. Data da consulta

A votação realizar-se-á no Domingo, 8 de Agosto de 1999, tanto dentro como fora de Timor Leste.

B. Pergunta a ser apresentada aos votantes

A pergunta que o Secretário-Geral colocará aos votantes é a seguinte:

"Aceita a autonomia especial proposta para Timor Leste integrada no Estado Unitário da República da Indonésia?" ACEITO
OU
"Rejeita a autonomia especial proposta para Timor Leste, levando à separação de Timor Leste da Indonésia? REJEITO


O logótipo das Nações Unidas aparecerá nos boletins de voto. Os boletins de voto incluirão símbolos que possibilitem a votação de pessoas iletradas.

C. Direito a votar

As seguintes pessoas, com 17 anos de idade ou mais, poderão votar na consulta popular:

(a) pessoas nascidas em Timor Leste,

(b) pessoas nascidas fora de Timor Leste mas com pelo menos um progenitor nascido em Timor Leste, e

(c) pessoas cujos cônjuges sejam abrangidos por qualquer das categorias supracitadas.

D. Calendário para o processo de consulta (em períodos de tempo sobrepostos)

O calendário para as fases operacionais do processo de consulta será aproximadamente o seguinte:

Planeamento operacional/Colocação do pessoal ................ 10 de Maio-15 de Junho
Programa de informação/sensibilizaçao da opinião pública .. 10 de Maio-5 de Agosto

Educação dos votantes

Preparação e Recenseamento ----------------------------------- 13 de Junho-17 de Julho
Apresentação de listas e contestações/ --------------------------18 de Julho-23 de Julho


Decisões sobre contestações e reclamações

Campanha política ------------------------------------------------ 20 de Julho-5 deAgosto *

Período de reflexão ----------------------------------------------- 6 de Agosto-7 de Agosto

Dia da votação ---------------------------------------------------- 8 de Agosto

*sujeito a revisão


E. Fases Operacionais

a) Campanha de Informação

b) Recenseamento

c) Campanha



d) Votação em Timor Leste



e) Votação fora de Timor Leste



f) Observadores



F. Financiamento

O Secretário-Geral procurará obter a aprovação do Conselho de Segurança para a operação, por forma a assegurar o financiamento do orçamento estimado.
As contribuições voluntárias serão canalizadas através de um Fundo de Afectação Especial (Trust Fund) criado para este efeito.

G. Segurança

As autoridades indonésias garantirão um ambiente de segurança para um processo de consulta popular livre e justo e serão responsáveis pela segurança do pessoal das Nações Unidas.
Será colocado no terreno um número de elementos de segurança das Nações Unidas para garantir a segurança do pessoal e dos bens das Nações Unidas.
Será também colocado em Timor Leste um contingente de polícias civis internacionais para assistir a polícia indonésia durante as fases operacionais da consulta popular e, no momento da consulta, para supervisionar a escolta dos boletins de voto e das urnas de e para os locais de voto.


Feito em Nova Iorque neste dia 5 de Maio de 1999

Pelo Governo da Indonésia
Ali Alatas
Ministro dos Negócios Estrangeiros

Pelas Nações Unidas
Kofi A. Annan
Secretário-Geral

Pelo Governo de Portugal
Jaime Gama
Ministro dos Negócios Estrangeiros